Os tempos que desfrutamos hoje em 4012, eram antigamente mera utopia. O amor havia adoecido – amor a si próprio e aos outros. Durante milênios, a autoestima, esse núcleo essencial do ser humano, nunca havia sido nutrida, levada em consideração e brotado em nação alguma. Claro, ao longo das idades houve indivíduos cuja mente e coração floresceram sem trair: seres fraternos com todas as formas de vida. Mas, não foram muitos.
As prisões viviam cheias; abuso, traição, falsidade, ganância, guerra, crime e indiferença eram pragas comuns nas elites governantes. Sempre uma sede repugnante de diminuir e controlar os outros para de se sentir melhor. Porém, lá pelo final do século XX e nas primeiras décadas do século XXI, diversos ramos da ciência derramaram galáxias de luz sobre a gênese de um ser humano plenamente saudável, confirmando o que muitas tradições sábias e sagradas ensinavam desde a aurora dos tempos. A extraordinária orquestração fisiológica do nosso desenvolvimento no ventre materno finalmente começou a ser compreendida, apreciada e respeitada! Os bebês foram tendo condições cada vez melhores para formar órgãos robustos e resilientes – especialmente o cérebro – graças a ótimos nutrientes e uma favorável bioquímica fluindo pelo sangue de suas mães.
Nas escolas e nas universidades, alunos de todas as idades estudaram o plano da natureza para um pleno período primal. Pelo mundo inteiro, governos começaram a despertar para a simples e grandiosa realidade de que toda gestante precisa, acima de tudo de comida, alegria e beleza ao seu redor. Pela primeira vez em mais de 12.000 anos, as sociedades começaram a dedicar importantes recursos financeiros e culturais para o bem estar das grávidas, protegendo assim esse período decisivo da maternidade. Pela primeira vez em tantos milênios, os poderes governamentais entenderam: as Mães são as que dão à luz às civilizações.
O século XXI viu o início dos parques que temos hoje nas cidades, seus subúrbios e distantes vilarejos. Lugares de encontro construídos em lindos lugares onde as gestantes caminham pela natureza, cantam juntas, descansam, tecem, pintam, leem, escrevem, dançam, nadam… se alegrando com a deliciosa sinergia entre os pequenos habitantes em seus ventres. A humanidade aprendeu o quão receptivos nós somos ao mundo interior dos nossos pais, que a integridade do nosso corpo adulto e seus trilhões de células começa na natureza amorosa, do abraço sexual que nos concebe. Gestações não desejadas ficaram cada vez mais raras. Até mesmo os meses antecedendo uma concepção começaram a ser vividos conscientemente.
Ah! E tenho que falar do nascimento! A ignorância que havia submergido a maioria das práticas em torno ao nascer, pouco a pouco diminuiu e morreu. O uso desenfreado de intervenções tecnológicas – finalmente reconhecidas como contraprodutivas e, em muitos casos, abusivas – atingiram um ápice no início do século XXI. Mas, logo depois, e de uma vez por todas, os “peritos” confiaram na sabedoria do corpo de cada parturiente e a deixaram em paz. Tranquilidade e privacidade foram abraçadas como as principais facilitadoras do trabalho de parto e do nascimento pleno.
A década dos anos 2050 foi o ponto de mutação: a primeira geração dos bem nascidos atingiu a maturidade. Eles se tornaram professores, artistas, mercadores e políticos de uma espécie diferente. A presença deles no planeta trouxe mais criatividade, empatia, flexibilidade, inteligência social e resiliência no âmago da família humana.
Eles tiveram seus próprios filhos e, de geração em geração, os benefícios do investimento na saúde primal se revelaram exponenciais. As pessoas passaram a viver mais tempo e desfrutando de um maior bem estar. O aleitamento materno se tornou incontestável e universal, as amas de leite e os leites artificiais adentraram a obsolescência. Prisões, asilos psiquiatras e unidades de tratamento intensivo neonatal foram fechando suas portas. As fronteiras artificiais entre as nações foram declaradas retrógradas e eliminadas.
Bem, foi assim que atingimos essa idade de ouro, tão desejada pelos nossos ancestrais e para a qual eles tanto trabalharam.
Laura Uplinger
Para uma mesa redonda na Mid-Pacific Conference On Birth And Primal Health Research, organizada pelo Michel Odent e a Heloisa Lessa em Honolulu, em outubro de 2014.